Quem poderia
imaginar que a “sacrossanta “ Jennifer Jones (1919-2009), que encantou os
corações religiosos revivendo o milagre de Lourdes em A Canção de Bernadette –
pelo qual chegou a ganhar um Oscar de melhor atriz de 1943 – agora escandalizando
tanta gente, prevaricando, totalmente lasciva de corpo e alma, nas imagens
extravagantes no imortal clássico do Western DUELO AO SOL (Duel In The Sun).
Na estreia
do filme, em dezembro de 1946, as ligas da decência americana preferiram
denomina-lo Lust in the Sun (traduzindo:
Luxúria ao Sol). Era mais do que um Super Western de 5,2 milhões de dólares, a
celebração descabelada do erotismo, das paixões encolerizadas, dos pendores sadomasoquistas
e da brutalidade glamurizada (adultério, assassinato, violação).
No afã de
superiorizar seu E O Vento Levou (1939), o produtor David O Selznick (1902-1965)
ultrapassara os limites do Código Hays – A censura Hollywodiana – e, após
muitos arranjos, teve de suprimir três minutos de metragem final, modificando
uma cena em que Jennifer Jones, ameaçada por Gregory Peck (1916-2003) – um cowboy cínico e
atrevido- resiste aos avanços sensuais e por fim se rende com visível prazer,
ao estupro.
O autor da
novela original, Niven Busch (1903-1991, foto), negociava os direitos do seu livro
para a RKO, em 1944, e cogitava de produzir o filme, tendo sua mulher, Teresa
Wright (1918-2005) no papel que coube a Jennifer Jones, a sensual e selvagem
mestiça Pearl (Perla) Chavez. Mas grávida, Teresa ficou de fora do projeto, e a
RKO pediu a Selznick que cedesse Jennifer Jones, para contracenar com John
Wayne (1907-1979), o primeiro escalado para o papel de Lewt McCanies. Em vez
disso, Selznick comprou os direitos do filme e a lançou em uma superprodução,
ao seu estilo.
A produção,
como no caso de E O Vento Levou, foi
atribulada. O próprio Selznick, em parceria com Oliver H.P. Garrett
(1894-1952), escrevia e reescrevia o roteiro em plena filmagem, cujas as
externas se iniciaram em março de 1945, perto de Tuckson, Arizona, com locações
extras rodadas em San Fernando Valley, Califórnia. A 10 de agosto, o diretor
King Vidor (1894-1982, foto) irritou-se com as constantes intervenções do produtor e
largou o filme no meio. Para completa-lo, Selznick convocou William Dieterle
(1893-1972) -que foi o responsável pela
sequencia de abertura da dança de Tilly Losch (1903-1975) num cabaré - William
Cameron Menzies (1896-1957), este o planificador da produção, e Josef Von
Sternberg (1894-1969), que foi o consultor visual.
Após nove
meses de filmagem, foram rodadas 26 horas e meia de filme, afinal, reduzidas
para 136 minutos. Ao todo, atuaram 8 cineastas, que além dos citados, os
responsáveis pela segunda unidade, Otto Brower (1895-1946), B. Reeves Eason (1886-1956),
e Chester Franklin, e o próprio Selznick, que dirigiu pessoalmente quatro
cenas. No fim, Vidor ganhou na justiça o direito de figurar nos créditos como o
único diretor.
Selznick
tudo fez para perpetuar algo como um outro E
O Vento Levou, mas desta vez passado no Oeste, mantendo vários elementos da
equipe técnica do eterno clássico de 1939- Menzies como o designer, Jack Cosgrove (1902-1965) nos efeitos especiais, Hal C.
Kern (1894-1965) na edição, e Ray Rennahan (1896-1980) no acabamento
fotográfico.
Sua nova “Scarlett
O’ Hara”, Perla Chavez, foi produto de verdadeira paixão: Selznick, que tinha
colocado Jennifer Jones em Desde que partiste, em 1943, estava
tão interessado na atriz, que acabou se divorciando da mulher Irene para casar
com sua nova Estrela, em 1949. Não logrou, como pretendia, projetar Jennifer
Jones como mito sexual. Em compensação, DUELO AO SOL ficou na história como
o filme que introduziu o chamado “beijo francês” no cinema americano. Com esta obra, Selznick arrebatou o prêmio
especial de melhor conjunto de produção no festival de Veneza de 1948.
A História é
a seguinte:
Scott Chávez
(Herbert Marshall,1890–1966) mata sua mulher adúltera (Tilly Losch) e o amante.
Enquanto aguarda na prisão sua execução por enforcamento, ele conforta sua filha
Pearl, dizendo-lhe que já acertou para que ela vá morar com sua prima e
ex-noiva, Laura Belle McCanles (Lillian Gish, 1893-1993), agora casada com um
senador e rico barão de gado, Jackson McCanles (Lionel Barrymore, 1878-1954).
Assim, após
a morte do pai, Pearl viaja até Paradise Flats, no Texas, onde é bem recebida
no rancho por Laura Belle e por seu filho mais velho, o advogado Jesse (Joseph
Cotten, 1905-1994), e com certa hostilidade pelo senador, preso a uma cadeira
de rodas.
Logo ao
chegar, Pearl passa a ser o centro de uma luta entre Jesse e seu irmão Lewt
(Gregory Peck), ambos atraídos pela bela mestiça. Certa manhã, ao vê-la nadando nua num pequeno
lago, Lewt fica até o fim da tarde esperando que ela saia d'água para
vê-la. Ao chegarem atrasados para o
jantar, Laura Belle suspeita, pelos cabelos molhados de Pearl, que os dois
estiveram nadando juntos.
Ao tomar
conhecimento que a ferrovia pretende se expandir através de suas terras, o
senador e outros barões de gado se juntam para tentar impedi-la. Como Lewt encontra-se fora, em El Paso, Jesse
é obrigado a acompanhar o pai. No
encontro com o presidente da ferrovia, Jesse se posiciona contra o pai, sendo
por este expulso de casa.
Quando Lewt
retorna ao rancho, descobre que Pearl encontra-se sozinha em seu quarto e a
estupra. Mais tarde, ao se preparar para
deixar a casa do pai, Jesse ouve a voz do irmão vindo do quarto de Pearl. Antes de sair, confessa seu amor por ela,
embora acredite que seja tarde demais.
Os meses se
passam e todos agora admitem que Lewt e Pearl são amantes. Perguntado se ele se casaria com ela, Lewt
responde que sim. Por trás, entretanto,
assegura ao pai que Pearl é apenas um
passatempo.
Durante um
baile, Pearl pretende anunciar seu noivado com Lewt, mas este a
menospreza. Ao sair do local em
lágrimas, encontra Sam Pierce (Charles Bickford, 1891-1967), um homem bem mais
velho com idade para ser seu pai. Este
se diz atraído por ela e lhe propõe usar suas economias para comprar um rancho
para eles, caso ela o aceite. Momentos
depois, ela concorda em se casar com Sam, embora admita que não o ame.
Na noite
anterior à data do casamento de Pearl, Lewt procura Sam e o mata, tornando-se
um fora-da-lei cuja captura será recompensada com US$ 2000. Embora foragido, Lewt procura Pearl, mas esta
inicialmente o rejeita. Depois, quando
ele lhe diz que pretende comprar um rancho no México, ela lhe pede para que a
leve consigo. Desapontando-a, ele lhe
diz que não pretende se casar, mas que, uma vez ou outra a procurará como
naquela noite.
Laura Belle
adoece e morre pouco tempo depois. Ao
tomar conhecimento da doença da mãe, Jesse retorna ao rancho, onde não a
encontra mais com vida. Na ocasião, ele
pede à Pearl para que ela vá morar em Austin com ele e com Helen Langford (Joan
Tetzel, 1921-1977), a filha do presidente da ferrovia, com quem ele pretende se
casar. Pearl agradece o convite mas não
o aceita.
Jesse envia
um bilhete para Lewt, propondo um duelo por causa de Pearl. Lewt encontra-se com ele na rua de Paradise
Flats, ferindo à bala seu irmão desarmado.
Pearl cuida de Jesse até a chegada de Helen.
Chocada com
o ato praticado por Lewt, e com receio de que mais tarde ele volte para matar o
irmão, Pearl decide ir ao seu encontro e enfrentá-lo. Depois de uma viagem a cavalo de dois dias,
ela o encontra. Ao vê-lo de longe,
começa a atirar. Ele responde da mesma
forma. O duelo continua até que os dois
são mortalmente feridos.
Arrastando-se,
ela consegue chegar até ele. Abraçados,
os dois confessam seu amor mútuo, morrendo ambos em seguida.
Por este
enredo, tão bem elaborado e avançado para sua época, que DUELO AO SOL se tornou um grande clássico, não apenas no gênero
Western, mas em geral para o Cinema, capaz de prender a atenção do espectador
do começo ao fim, onde inovou ousadia e erotismo como nunca visto antes em
Hollywood. A imponente
trilha sonora foi magistralmente composta por Dimitri Tiomkin (1894-1979).
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O Filme em cartaz nos cinemas do Rio de Janeiro em Setembro de 1961. |
FICHA
TÉCNICA
DUELO AO SOL
(duel in the sun)
Ano de Produção: 1946
Gênero: Western
Direção: King Vidor
Produção: David O’ Selznick, para os estúdios Selznick e
Vanguard Films.
Roteiro: David O’ Selznick, Ben Hecht, Oliver H.P. Garrett,
e Niven Busch (baseado em seu livro)
Fotografia: Lee Garmes, Ray Rennahan, Harold Rosson – em cores
Música: Dimitri Tiomkin
Metragem: 144 minutos/ 125 minutos pela TV
ELENCO
Jennifer Jones – Perla Chavez
Joseph Cotten – Jesse McCanles
Gregory Peck – Lewton “Lewt”
McCanles
Lionel Barrymore – Senador Jackson McCanles
Herbert Marshall – Scott Chavez
Lilian Gish – Laura Belle McCanles
Walter Huston – O Pregador
Charles Bickford – Sam Pierce
Harry Carey - Lem Smoot
Joan Tetzel – Helen Langford
Tilly Losch – Senhora Chavez
Butterfly McQueen – Vashti
Otto Kruger – Sr. Langford
Scott McCay – Sid
Sidney Blackmer – O Amante
Charles
Dingle – Xerife Hardy
Produção e
Pesquisa de PAULO TELLES.